Pesquisa de docente da Famez identifica alterações no proteoma de abelhas expostas a agrotóxicos

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Rodrigo Zaluski, professor da área de Apicultura e Meliponicultura da FAMEZ/UFMS, recentemente concluiu a análise de dados de sua pesquisa de doutorado em que identificou alterações na expressão de proteínas em abelhas nutrizes expostas ao inseticida fipronil, fungicida piraclostrobina e suas associações.
Professor Zaluski que desenvolveu sua tese na UNESP/FMVZ – Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Campus de Botucatu, com auxílio do professor Ricardo de Oliveira Orsi e Pedro de Magalhães Padilha, publicou os resultados do trabalho na conceituada revista Scientific Reports, do grupo Nature. O artigo completo pode ser acessado neste link: https://www.nature.com/articles/s41598-020-59070-8.

As abelhas apresentam papel fundamental na polinização em cultivos agrícolas e áreas de vegetação nativa, além de possuírem grande importância na Apicultura e Meliponicultura, garantindo a exploração de produtos de grande importância nutricional, farmacêutica e econômica.
Os principais resultados do estudo do Professor Zaluski indicam que agrotóxicos como o fipronil e piraclostrobina reduzem a produção de proteínas da geleia real que é o único alimento da rainha desde o início do seu desenvolvimento até o fim da vida, e de todas as larvas que se desenvolvem na colmeia até o terceiro dia de vida. A redução das proteínas que compõe a geleia real pode afetar o desenvolvimento de todos os indivíduos da colônia e prejudicar sua manutenção e sobrevivência. E de forma indireta, reduzir a produtividade das colmeias, reduzindo a oferta de mel, própolis e outros produtos. O Brasil produz atualmente cerca de 40.000 toneladas de mel anualmente (FAO, 2019), e de acordo com dados da Associação Brasileira de Exportadores de Mel (ABEMEL, 2018) apenas as exportações desse produto movimentaram mais de 92 milhões de dólares em 2016.

Exposição das abelhas a dieta contaminada com agrotóxicos. Observam-se em um dos núcleos utilizados no experimento, abelhas nutrizes marcadas se alimentando da pasta de pólen fornecida aos enxames.

O uso de agrotóxicos de diferentes classes tem causado sérios impactos para a manutenção das abelhas. Muitas vezes são noticiados casos de mortalidade imediata de colônias em função da sua exposição a altas doses desses produtos. No entanto, as abelhas são insetos que vivem em sociedades altamente organizadas, onde cada casta e indivíduo têm uma função específica que precisa ser executada de forma adequada para
que toda a colônia sobreviva. A exposição das abelhas a doses crônicas (muito pequenas ou subletais) de agrotóxicos pode prejudicar a função de indivíduos especializados na colônia, afetando sua manutenção.
No trabalho realizado por Zaluski, abelhas foram expostas a alimento contaminado com doses ambientalmente relevantes do inseticida fipronil (2,5ppb), fungicida piraclostrobina (850ppb), e suas associações (fipronil + piraclostrobina). Quantidades semelhantes desses agrotóxicos foram detectadas em recursos (néctar e pólen) e em colmeias, e por isso essas doses foram selecionadas para o estudo. Abelhas recém-emergidas com menos de 10h de vida tiveram o tórax marcado com tinta atóxica e foram introduzidas em colmeias onde receberam dietas a base de pólen contaminado ou não com os agrotóxicos. O principal objetivo do estudo foi estudar se a exposição das abelhas nutrizes aos agrotóxicos afeta seu proteoma (conjunto total de proteínas expressas por um organismo em determinado período).

Gel 2D-PAGE representativo da separação de proteínas de abelhas nutrizes (grupo controle). Setas apontam spots proteicos que apresentaram aumento de expressão (em azul) ou redução de expressão (em vermelho) quando comparados a abelhas expostas aos agrotóxicos.

Em uma colmeia, desde o nascimento até o 12º dia de vida, as abelhas ingerem grande quantidade de pólen, que fornece proteínas essenciais para o desenvolvimento das glândulas mandibulares e hipofaringeanas, responsáveis pela secreção da geleia real. Essas glândulas se localizam na cabeça e secretam maior quantidade de geleia real quando as abelhas apresentam seis dias de vida e são denominadas nutrizes. No estudo foi realizada a coleta das abelhas nutrizes no sexto dia de vida, extração das proteínas de suas cabeças e sua separação utilizando a técnica de 2D-PAGE (eletroforese bidimensional em gel). A técnica permitiu realizar a quantificação dos spots proteicos (proteínas) e analisar sua expressão comparando o proteoma de abelhas expostas e não expostas aos agrotóxicos. As proteínas presentes nos spots que apresentaram alterações na expressão foram identificadas por espectrometria de massas.

Dentre os principais resultados do estudo, destaca-se a redução da expressão de proteínas da geleia real em abelhas expostas aos agrotóxicos. Maior redução ocorreu no grupo exposto à associação dessas moléculas. Vale ressaltar que a geleia real é o único alimento da rainha desde o início do seu desenvolvimento até o fim da vida, bem como, de todas as larvas que se desenvolvem na colmeia até o terceiro dia de vida. Após o terceiro dia, larvas que darão origem a operárias e zangões se alimentam de uma mistura de geleia real, mel e pólen. A redução da expressão de proteínas que compõe a geleia real pode afetar o desenvolvimento de todos os indivíduos da colônia e prejudicar sua
manutenção.
Também foram detectadas alterações na expressão de proteínas do sistema antioxidante, sistema de detoxicação, síntese de energia, metabolismo de aminoácidos, sistema olfativo, aprendizagem e memória. Muitas proteínas dessas classes apresentaram redução na sua expressão, o que afeta diretamente o metabolismo e a capacidade de trabalho das abelhas dentro da colônia. Isso impacta na capacidade das colônias se desenvolverem de forma adequada e pode explicar porque muitos enxames são perdidos pelos apicultores ao longo do tempo sem sintomas clássicos de intoxicação por agrotóxicos.
Os resultados desse trabalho apontam para a necessidade de redução da exposição das abelhas a agrotóxicos, buscando alternativas ao uso dessas moléculas. Estratégias de Manejo Integrado de Pragas e de Controle Biológico devem ser incentivadas para reduzir os impactos que o uso de agrotóxicos tem causado em nossos ecossistemas. Novos estudos serão desenvolvidos nessa área pelo Grupo de Estudos em Apicultura e Meliponicultura Sustentável de Mato Grosso do Sul (GEAMS), recentemente implantado e coordenado pelo professor Zaluski.

Contato do Rodrigo Zaluski: rodrigo.zaluski@ufms.br / (67) 3345-3606

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